terça-feira, setembro 26

João Cabral de Melo Neto

Duas poesias de talvez o maior de nossos poetas.E duas poesias destinadas a outros dois poetas de igual grandeza.

O PERNAMBUCANO MANUEL BANDEIRA

Recifense criado no Rio,
nao pôde lavar-se um resíduo:
não o do sotaque, pois falava
num carioca federativo.
Mas certo sotaque de ser,
acre mas não espinhadiço,
que não pôde desaprender
nem com sulistas nem no exílio.

RESPOSTA A VINICIUS DE MORAES

Não sou um diamante nato
nem consegui cristalizá-lo:
se ele te surge no que faço
será um diamante opaco
de quem por incapaz do vago
quer de toda forma evitá-lo,
senão com o melhor, o claro,
do diamante, com o impacto:
com a pedra, a aresta, com o aço
do diamante industrial, barato,
que incapaz de ser cristal raro
vale pelo que tem de cacto.

Vejo os poemas de Cabral como pedradas.O mestre das pedradas.No título de seu primeiro livro, Educação pela pedra,é possível que ele queira mostrar isso. Mas esses poemas tirei-os de um outro livro seu, Museu de tudo. Atualmente para mim tudo é Joao Cabral,e por isso nao pude deixar de postar estes dois excelentes poemas.
é isso pessoal!

domingo, setembro 24

Quem pergunta quer saber...

Hoje é aniversário de Groba, vinte e quatro anos no dia 24! Eis que o comentário em nada engrandece este blog tão sortido de poesia, filosofia, conto, crônica. No entando eu não poderia deixar passar em branco tal constatação! A partir de hj será que Grobento jogará no meu time?


Feliz aniversário!!!! Bora comer essa água e lapidar a poesia já escrita dentro de nós!


Ana

quinta-feira, setembro 21

Província Láctea

--O Céu não pode mais ficar nesse vai-não-vai, nesse casa-não-casa, dizia uma das primas Anéisaturno, mesmo sendo de distante parentesco, sobre a conduta titubeante de tal ente cá na terra. –Já enamorou e esqueceu da Lua, naquele caso confuso, está lembrada, não? Depois o amor foi-se embora, o Céu se separou dela, passou um tempo deprimido, literalmente baixo astral, mas atualmente está noivo das Estrelas e não faz muito soube que anda por aí se esfregando com umas tais de Nuvens!—tabelava, indignada. –Dizem até que é caso antigo. Não sei não, viu. E outra coisa: você sabe qual o estado natural dessas Nuvens?
--Ouvi dizer que eram gasosas, mas desconfio que sejam na verdade sólidas. E então imagine você!, pôr em risco um matrimônio com as Estrelas em troca de sólidos!—lamentava a mais corporativa delas.
--Pois é...mas o fato é que ele desde moço sempre foi namorador. Fico a lembrar desse caso espichado que teve com a Lua, pensava até que ia sair casamento. Anos luz atrás, não me esqueço, o Céu punha pressa nas rotações pra chegar logo o anoitecer! Ah, e se a Lua se encontrasse cheia, com as estrelas ofuscadas, era logo aí que a madrugada se arrastaaaava... ,enchendo de coragem as declarações de amor dos terráqueos. Namoro que durou, corrija-me se estou enganada, para mais de milhões de anos em translações satúrnicas, não foi mesmo?
A sua prima aquiesceu. Acrescentou, entretanto, que a coisa começara a desandar quando o Céu dera para implicar com as inconstâncias da Lua. “Você muda ao sabor das marés!”, destemperava, fazendo-se ouvir anos-luz de distância! E, como não bastasse, quando a ciumeira dela com as Estrelas teve início, não houve outro jeito: tudo terminado entre os dois, completou.
--E logo depois veio as Estrelas e cá estamos presenciando um noivado que vai andando mal das pernas. Eu não entendo, absolutamente não entendo. Se ele não acaba de vez com essas aventuras púberes, não se conserta mais. Pois que além de tudo—não podia se conter—noivar com Estrelas é uma grande união! Quantos cometas e astros-reis já não lhes fizeram a corte sem êxito algum? E ainda chegou-me que essas Nuvens são um tanto esquecidas das poesias terráqueas, se comparadas à nobre linhagem metafórica das Estrelas. Imagine o dote!
--È Realmente lamentável, prima. Você tem toda razão. Acho falta de senso deixar enlace tão promissor em busca de aventuras, como diz. E não foi você mesma que me contou que eles andam sempre juntos, dia e noite?, e que essas Nuvens têm ainda por cima a ousadia de encobrir as Estrelas e esconder a Lua?
--Fui eu sim. Do jeito que está, estou pensando em viajar algumas órbitas pra aconselhar esse garoto...
E assim as duas primas Anéisaturno continuaram até o cair da tardinha sideral, tecendo considerações a respeito da conduta juvenil do afastado ente familiar na Província Láctea.

Arvore dos encantos

Acorda levanta resolve
Há uma guerra no nosso caminho
Nos confins do infinito
Nas veredas estreitas do universo
Vejo
As cinzas do tempo
O renascimento
As danças do fogo
Purificação transporte
Escuto
O trovão que escapou
As ladainhas das mulheres secas
Herdeiros do fim do mundo
Isso não é real
Não
Isso não é real
A brotação das coisas
Herdeiros da Tempestade
Girando em torno do sol
Do sol
Girando em torno do sol
Vejo
Aquele cego sorrindo
No nevoeiro da feira
Aquele cego sorrindo
Beijo
A fumaça que sobe
O peito da santa
O cheiro da flor
árvore dos Encantados
Vim aqui outra vez pra tua sombra
árvore dos Encantados
Tenho medo mais estou aqui
Tenho medo mais estou aqui
Aqui Mãe
Aqui meu Pai
Em cima do medo coragem . Recado da Ororubá

terça-feira, setembro 19

coisa besta....

Quem fuma Rei V não gosta de fumar cigarro, é apenas viciado.
na verdade o sol é vermelho
quase sem lua ou mar
não tem sentido ou gracejo
na verdade o que será?

no mais recôndito quarto
do meu flagelado condôminio
procuro os versos sem sentido,
mas sem sentido é o viver

poemas encomendam paz
gracejos por trás da guerra
por trás da tua aurora

gracejos que fluem no assaz
distante e intoxicado
caminho sem tregua jamais...

domingo, setembro 17

Orla da memória.

Quando vim morar na Pituba, em 1997, passei a ouvir as historias que meu pai costumava contar sobre as farras que ele fazia por “essas bandas”. Uisquinho no porta luvas, inseparáveis cigarrinhos, turma reunida, gostava de levar umas moças de carro para passar o dia destilando o lirismo dos areais, “pois era só o que tinha lá pra 69, 70”, dizia, “com umas praias que hoje não se vê mais, não essas que estão aí, todas poluídas!” Não havia melhor lugar pra se esquentar com uma menina do que o Jardim dos Namorado, garantia. E o que se vê agora? Um “Jardim dos Assaltados”. A avenida Manoel Dias nem asfalto tinha!, e hoje?: um adolescente morre a cada semana. A cidade veio feito uma locomotiva de edifícios orla a cima levando tudo o que tinha pela frente. Fiquei meio assustado com aquilo, mas não perguntei por que então nos mudamos diante de tantas inconveniência.
Não faz muito a Prefeitura deu o aval para que construtoras pudessem erguer prédios na orla de Salvador, quer dizer, ela liberou o “gabarito da orla”. Números mínimos de andares? Pensou-se em 4, discutiu-se 5 e até se aceitava 6; fixou-se em 12! O que havia parado em 1980 agora está renascendo de fôlego renovado. Não que a orla que vai do Costa Azul até Itapoã, ainda virgens, seja a Pituba de antigamente, não. E muito menos tenho o costume de ir à praia por lá. Mas já prevejo a herança de meu pai(e dos homens): direi a meu futuro filho, olha, aqui tinha uma pista de barro, mas uma pista tão triste que dava pena; mais pra frente tinha uma borracharia que saía a cerveja mais gelada da cidade!....
Ali um circo lúgubre, mas vivo, muito vivo; na altura do parque toda a meninada da área descia pra soltar papagaio..., certamente direi. Não é a Pituba de antigamente, sei, mas não abro mão de nada.

Frase que não lembro de quem, mas muito boa.

"Antes era Zeus, depois veio Deus, agora sou Eus"

sábado, setembro 16

. paixão

coisa que toma inteira.
existo-te.
ou inexisto?

quinta-feira, setembro 14

o vento de tua varanda
é quente e me faz mal
não suporto ver tua ciranda
tua varanda, teu carnaval...
não mais vejo coisa alguma
do fundo não enxergo direito
não enxergo o teu desespero
não enxergo teu nobre desejo

terça-feira, setembro 12

Viagem de ônibus

Chegaram as deliciosas balas de caramelo com chocolate!
Uma é dez,
Cinco é cinqüenta,
Dez é um real
E 15 é um vale!
-3 mim-
Pessoal, pessoal....
Desculpa incomodar o silêncio da viagem de vocês.
Mas tenho aqui esses lápis que são feitos de silicone.
No armarinho você encontra somente um desses por 50 centavos.
Comigo a senhora leva 6, (seis), de presente pro seu filhinho, sobrinho, netinho por
Apenas 1, (um), real.
Veja! eles entortam, não quebram, tem uma variedade de cores, faz a alegria da meninada!
-5 min-
Desculpa eu estar aqui para tirar o sossego da viagem de todos os passageiros.
Só queria um pouco da atenção de vocês para minha história pessoal, pessoal.
Eu era um drogado, vim de São Paulo fugindo de ameaças,
Fiquei na rua convivendo com o pior tipo de gente,
Cheirava cola, cocaína, bebia cachaça, fumava crack, roubava,
Mas agora, pessoal, posso dizer, estou recuperado, a Casa de Recuperação Faz Milagre Me mostrou que temos um papel na sociedade, uma função, uma missão,
E hoje tenho muitas responsabilidades com o Senhor...
Então, para que nunca acabe o serviço feito pela nossa Casa de Recuperação, para que
Outras pessoas como eu possa deixar de viver na escuridão, quem pudesse contribuir comprando estas canetas com a mensagem da Casa...
-4 min-
Boa tarde.....BOA TARDE!?!?
--Boa tarde, sai lá de trás.
Para não tomar muito o tempo de todos, estou aqui somente para lembrar aos mais avançados nos anos; aos que já passaram dos 65, para lembrar que estamos em período de vacina contra gripe. Vem aí o inverno e a mudança de temperatura espalha pelo ar diversos tipos de vírus e indescritíveis viroses que podem ser fatais para os mais fraquinhos, sabe? Então todos vocês, que têm pais velhinhos, tios, avos, não deixem de lembrar-lhes de ir ao posto de vacinação mais próximo...
-1min.-
Estou pra pedir pra quem pode me ajudar mesmo com pouco de dinheiro pra
Poder pagar o tratamento do meu pobrema das pernas. Esse aqui, para vocês poder ver, é a receita do Dotô, o preço do remédio pra vocês ver...
Eu ainda ajudo minha mãe que tá doente, e a fraqueza nas pernas não deixa eu trabalhar pra ganhar dinheiro pra casa, pra ajudar minha mãe. Qualquer trocadinho serve...
-5 min-
Por favor, os homens queiram me acompanhar descendo do ônibus.
As mulheres podem ficar, não é necessário descerem, nossas policiais as revistarão aqui mesmo.
Não voltei...
(era meu ponto)

sábado, setembro 9

A maconha me faz experimentar a tudo como que pela primeira vez, tecidos, músicas, versos, dinheiro, mulheres..., pois logo depois os esqueço por completo.
façamos mais um soneto?
façamos mais uma bobagem?
iremos contra a corrente?
Neste fim de tarde?

queriamos na verdade paz?
ou na verdade que haja guerra?
entretemo-nos com a liberdade?
ou com nossa calma venerea?

procuraremos respostas agudas,
no quarto deste condomínio,
que não é minha casa?

beijaremos nossos anseios
procuraremos nossas saudades
resistiremos a tempestade?

quarta-feira, setembro 6

mundo magnetico das almas retorcidas

Bloggear no mundo é o que resta
nessa terra de transe e falsas aspirações
mundo caduco que nos aguarda
para poder ter mais um sonho sem razão

poderosas energias confluentes
que sintonizam o sonho e o chão
sensibilidade agudamente muda
que procura por versos como à um trovão

subitamente recheio minha carne de desespero
anseios
vomitos, lamurias e um pão...
retorce a carne bruscamente,
como que se não houvessem mais senões...

Alguem,
no mais recôndito quarto aceso a luz de velas
grita cruamente
pedindo um não?

Sei não, mas retorno ao mundo cheio de lamentações...

terça-feira, setembro 5

decomposicionamento

não se pode dizer nada.
é a mesma mentira, sempre,
vívida e gorda.

num segundo tenho domínio sobre os tons
mas bastam dois suspiros
para ferver meu sangue de barata.

novamente a cabeça trava
novamente o olhar turvao peito se desembesta.
(ex-poetaneo-pedintepós-pensante...)

num segundo tenho domínio sobre os tons
mas bastam dois suspiros
para ferver meu sangue de barata.

ao diabo com tua força de formiga!
teus sorrisos fáceis, sempre,
zombando de minha fé.

teimando em esqueçer;
retrucando, retrucando, retrucando,
o que não pode ser escutado...

mas que conversa é essa?!
como é possível, alías,
ser hipócrita com tamanha veemência?

joelhos de princesa, estes teus,
olhos de cachorro, estes teus,
e que capacidade, inexplicavelmente imbecil...

não se pode dizer nada.
é a mesma mentira, sempre,
vívida e gorda.

donde retiro, luz vacilante,
sonho de tudo-errado:
paciência meu filho.

amanhecer gelado...
possível inquestionável descomeço
me deixe mudo?

fecho os olhos por não ter o direito de ser covarde.
é uma penas, deveras,
que coisa mais ridícula...

7-9-2005 (independencia ou morte)

segunda-feira, setembro 4

carta ao tumulo maior

falta algo meu deus
nesse mundo de tantas guerras e adeus...
fata algo de humano
de puramente pueril
de totalmente senil
falta algo...
deus sinto que me dizem alguma coisa
não sei se é a poesia que lhe escrevo
não sei se é a suplica que lhe faço
não sei se é o desejo mal dissimulado,

meu deus falta alguma coisa no mundo
esse mundo de "fezes, maus poemas e espera"
venera lago que pede perdão
resignificação, serafismo puramenete simples
sobreposto, mal posto
imposto

a sua morte é algo duro pro mundo
seu nome foi embora, e agora?
sinto em dizer que tú eras o grande pai...
ó filosofos do porvir o que fizestes com o mundo?
tem algo de errado no humano e deus morreu
segurem suas calças, afinal
deus morreu...

domingo, setembro 3

Boato que corre à boca pequena no mirante:

A bixa é a raspa do chifre do demônio.

filosofia

Pelo que pude entender, quando Heidegger afirma que o ‘pensar chegou ao fim’, ele quer dizer que o seu objetivo-- a busca pelo sentido existencial do homem, presente neste ato,-- extraviou-se (ou tornou-se impuro, se posso me expressar assim): que ele ganhou outro rumo, que sofreu um desvio em direção ao ambiente acadêmico e por isso mesmo hoje o consideramos como uma atividade cultural e não mais pertencente à essência do homem . Deixamos de pensar e passamos agora a ‘filosofar’ nas universidades. E, desde que mergulhada em técnicas de explicação—o que é característico da produção científica universitária—o pensar se resume então publicamente em ‘ismos’, ou, se ainda posso dizer desse modo, o pensar se populariza em ‘ismos’. E é neste ponto que confesso que a relação que aí existe com a ‘ditadura da opinião pública’ me escapa. O que absorvi nesse sentido foi que Heidegger quer passar que esta ‘ditadura da opinião pública’ surge como uma espécie de bloqueio para o verdadeiro objetivo do ato de pensar; e um bloqueio porque enfrenta obstáculos como a’ linguagem a serviço das vias de comunicação’, o que muitas vezes acorrenta e paralisa a reflexão originária (o ato de pensar em seu estado berçário, antigo, aristotélico), pois o contato com nosso avassalador modo de viver em tempos modernos lhe cortam as asas. È seguindo esse raciocínio que você ,Martim, diz que a busca por um ‘sentido profundo’ da existência humana é refreada, perde força, né?Diante de tanta produção técnica e cientifica que nosso tempo moderno produz, chega a ser anacronismo alguém querer filosofar sobre o sentido da existência humana, pois tudo já está cientificamente comprovado, ou quase tudo, pois o que restou é dispensável....
Mas o que mais me chamou a atenção no seu texto foi a associação que você fez da construção cultural e histórica da humanidade(de onde a partir daí ela busca o sentido existencial de si mesma)—com um tipo de segunda natureza do homem. Isso me fez pensar em muitas coisas. Um achado! E é fato também!: a cultura é uma segunda natureza do homem.
A pouco tempo estava discutindo com minha menina que amo tanto se o egoísmo é inato ao homem; se podemos dizer que essa característica vem antes do coitado nascer ou se é construída de acordo com suas experiências vividas, das mais remotas às mais maduras..Ela dizia que sim, que o homem já nasce com o egoísmo impregnado, que se pode apontar para um bebe de 10 dias e sem dó nem piedade acusá-lo de egoísta; ela argumentou que o instinto de sobrevivência o condiciona a isso, que faz parte da natureza do homem ser egoísta. Achei meio duro aquilo e retornei perguntando-lhe se não seria justamente o viver, o acumular experiências,o entrar em contato com o mundo,enfim, o sobreviver para que se construa um ‘instinto de sobrevivência’? E em seu jeito todo meigo ela me disse que sou construtivista; sei não.... Mas o certo é que eu deveria ter dito a ela que existe no homem uma segunda natureza!, natureza esta que é construída pela experiência cultural vivida em sua historia....

Mas enfim, muito do que conclui é fruto tanto da leitura do texto de Haidegger(texto mais trincado!) como do seu também, Martim. Notei que você se referiu, ao que Haidegger chamou de ‘ato de pensar’, como ‘reflexão originária(...) aquele que nos tira o sono por seu significado paradoxal, ou mesmo aquele que nos impulsiona à construção de uma realidade social diferente para nossos descendentes(…)’, e o enquadrou “enquanto ‘desejo’ essencial da humanidade”, concluindo então que ele está sufocado pelo saber técnico em nosso tempo.
O que queria dizer por ultimo é que me ficou a impressao de uma certa nostalgia por parte desse ato de pensar que voce buscam uma nostalgia redentora( foi o que me pareceu),tendo como referência os antigos filosofos. Nao podemos buscar uma maneira recuperar este ‘ato de pensar’, antigo, mais puro, dentro dos limites do nosso tempo moderno mesmo?, pois voltar a história é impossível.

(agora com minhas proprias palavras...)


Diante da existência, a humanidade procura a si mesma... Com o passar do tempo, guardando lembranças, constroí o edifício da história e mergulha nas águas (salubres?) da cultura. Aquilo que somos, e simultaneamente procuramos, acaba por se transformar de modo imprevisivel: à primeira natureza se sobrepõe uma segunda, e, de alguma forma, a busca parece haver se perdido. Deslumbrada com suas próprias capacidades, e ao mesmo tempo diante da aparente impossibilidade de dar um sentido profundo à sua existência, a humanidade tenta afinal convencer a si mesma de que não existem mais dúvidas sobre seu lugar no cosmos... Na idade da ciência, em que vivemos, qualquer reflexão "filosófica" não passa de uma espécie de anacronismo em vista do "glorioso" advento da civilização.
Na primeira frase e premissa da Metafísica, Aristóteles afirma que "todos os homens desejam ardentemente saber". Mas, afinal, todos desejam saber o quê? Hoje, milênios após os dias em que viveu o filosófo de Estagira, as pessoas tem orgulho de viver na auto-proclamada Sociedade da Informação, como se toda a miséria e ignorância cultivadas sistematicamente não lhes dissesse coisa alguma. Será que é mesmo isso que todos os homens desejam, informação, pura e simplesmente? Mas para quê? Antes de aceitarmos as mesmas soluções definitivas para todas as questões profundas da existência, tal qual nos ensinam nossos contemporâneos, podemos talvez nos questionar se é isto que desejamos ardentemente saber. Ao contrário, o conhecimento hoje em dia tão abundante, não é mesmo aquele que nos tira o sono por seu significado paradoxal, ou mesmo aquele que nos impulsiona a construção de uma realidade social diferente para nossos decendentes, mas um conhecimento dito como, acima de tudo, imparcial e operacional, daqueles que se encontram registrados nos cartórios e enclausurados nas academias. A reflexão em sua experiência originária, o simples pensar da existência enquanto "desejo" essencial da humanidade, permanece sufocada pela hegemonia globalizada do saber técnico...

sábado, setembro 2

Mais uma de cordel do fogo encantado

"...quando a dor se aproxima
fazendo eu perder a calma
passo uma esponja de rima
nos ferimentos da alma...

O espetaculo não pode parar..."
"Quando o pensar chega ao fim, na medida em que sai do seu elemento, compensa esta perda, valorizando-se como telós, como instrumento de formação e, por este motivo, como atividade acadêmica e acabando como atividade cultural. A Filosofia vai transfomar-se em uma técnica de explicação pelas causas últimas. Não se pensa mais; ocupamo-nos de "Filosofia". Na concorrência destas ocupações, elas então exibem-se publicamente como "ismos", procurando uma sobrepujar a outra. O domínio dessas expressões não é casual. Ele reside, e isto paticularmente nos tempos modernos, na singular ditadura da opinião pública. A assim chamada "existência privada" não é, entretanto, ainda o ser-homem essencial e livre. Ela simplesmente crispa-se numa negação do que é público. Ele permanece o chantão dele dependente e alimenta-se somente do recuo diante do que é publico. Ela atesta, assim, contra a sua própria vontade, a sua subjulgação à opinião pública. Ela mesma pórem, é a instauração e dominação metafisicamente condicionadas - porque se originando do domínio da subjetividade - da abertura do ente, na incondicional objetivação de tudo. Por isso, a linguagem põe-se a serviço da meditação das vias de comunicação, nas quais se espraia a objetivação, como acesso uniforme de tudo para todos, com o desprezo de qualquer limite. Deste modo, a linguagem cai sob a ditadura da opinião pública. Esta decide previamente do que é compreensível e do que deve ser desprezado como incompreensível."

-Heidegger, carta sobre o "humanismo" -